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Sobre a liberdade de associação

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

A nossa Constituição da República, alinhada com os instrumentos internacionais e continentais, salvaguarda a liberdade de associação, como um dos direitos mais básicos dos seres humanos, e garante que cada Moçambicano e Moçambicana seja livre para se organizar, formar e participar de associações, seja formal ou informal e que o Estado tem a obrigação de criar as condições legais, políticas, institucionais e práticas para que todos os membros da sociedade, sem discriminação de cor de pele, orientação sexual, condição física ou mental gozem dos seus direitos civis.

A nossa Constituição da República, não só reconhece o direito dos cidadãos de se juntarem em associação para perseguir e alcançarem os seus próprios interesses enquanto grupo (n° 1 do artigo 52 da CRM); reconhece o direito das associações a organizarem-se e a prosseguirem livremente as suas actividades (n° 2 do artigo 52 da CRM), mas também reconhece o importante papel que as organizações sociais desempenham na “promoção da democracia e na participação dos cidadãos na vida pública” (n° 1 do artigo 78 da CRM).

O problema com a Proposta de Lei das Organizações sem Fins Lucrativos

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos depositada na Assembleia de República em Outubro de 2022, ao atribuir poderes excessivos e discricionários ao Governo de reconhecer, controlar o funcionamento e extinguir as associações/organizações da sociedade civil, impor regras e exigências intrusivas e exageradas as associações e seus membros e ao usar razões infundadas como ‘disciplinar...controlar práticas inadequadas... e prevenir o financiamento ao terrorismo...’ pretende limitar o teu direito à liberdade de associação em oposição ao papel que se espera do Estado de criar o ambiente para o pleno gozo dos direitos fundamentais e em violação à Constituição da República (artigos 52, 78 e 43) e às obrigações do País ao abrigo dos instrumentos internacionais e regionais de direitos humanos.

Lembra-te, és livre de organizar, formar, comunicar e participar de grupos, sejam formais ou informais, fora do Estado e do Mercado, para seguir teus interesses e influenciar a vida política, social e económica ao teu redor (CRM art. 52 e 43). Os limites constitucionais à tua liberdade de associação consistem em não se poderem constituir associações armadas de tipo militar ou paramilitar, ou que visem promover a violência, o racismo, a xenofobia, ou para qualquer outro fim contrário à lei (n° 3 do artigo 52 da CRM).

Falta de participação pública no desenho da proposta de lei

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

Em Setembro de 2022 o Governo aprovou uma proposta de lei para estabelecer o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das organizações sem fins lucrativos sem qualquer participação dos interessados (os cidadãos e as associações). A efectivação do Estado de Direito Democrático resulta, também, do respeito e materialização da participação pública nos processos de tomada de decisão, sobretudo quando afectam os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos como é o caso da liberdade de associação e o exercício da cidadania (artigo 3 da CRM).

Lembra-te, és livre de organizar, formar, comunicar e participar de grupos, sejam formais ou informais, fora do Estado e do Mercado, para seguir teus interesses e influenciar a vida política, social e económica ao teu redor (CRM art. 52 e 43). Os limites constitucionais à tua liberdade de associação consistem em não se poderem constituir associações armadas de tipo militar ou paramilitar, ou que visem promover a violência, o racismo, a xenofobia, ou para qualquer outro fim contrário à lei (n° 3 do artigo 52 da CRM).

Denominação sem dignidade constitucional

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos, depositada na Assembleia de República em Outubro de 2022, pretende revogar a Lei das Associações (lei n° 8/91 de 14 de Julho), o instrumento que regula as Organizações Não Governamentais internacionais (decreto n. 55/98 de 13 de Outubro) e trazer uma nova designação por uma das suas características. A denominação ‘sem fins lucrativos’, não tem reconhecimento e garantia constitucional, pois no código civil e na constituição da República de Moçambique só estão previstas associações e organizações sociais. Não existe nenhuma razão para que a noção constitucional de associação se afaste da noção corrente do Direito Civil, ou seja, uma organização de pessoas (o que as distingue das fundações), sem fins lucrativos (o que as distingue das sociedades).

Lembra-te, és livre de organizar, formar, comunicar e participar de grupos, sejam formais ou informais, fora do Estado e do Mercado, para seguir teus interesses e influenciar a vida política, social e económica ao teu redor (CRM art. 52 e 43). Os limites constitucionais à tua liberdade de associação consistem em não se poderem constituir associações armadas de tipo militar ou paramilitar, ou que visem promover a violência, o racismo, a xenofobia, ou para qualquer outro fim contrário à lei (n° 3 do artigo 52 da CRM).

Financiamento ao terrorismo usado como falso pretexto

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos, depositada na Assembleia de República em Outubro de 2022, estabeleceu, sem necessidade, no seu artigo 4, um regime subsidiário da “legislação sobre a prevenção, repressão e combate ao terrorismo e a proliferação de armas de destruição em massa, sobre branqueamento de capitais e demais legislação aplicável” (As Organizações Sem Fins Lucrativos regem-se pela presente lei e, subsidiariamente, pela legislação sobre a prevenção, repressão e combate ao terrorismo e a proliferação de armas de destruição em massa, sobre branqueamento de capitais e demais legislação aplicável.). Tal era desnecessário- quer em termos metodológicos como pelo facto de já existir legislação específica sobre o assunto e até existir um artigo específico sobre o assunto (artigo 59 da lei 11/2022 de 7 de Julho).

O que afinal diz o artigo 59 da lei sobre branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo de 11/2022 de 7 de Julho?

  • Limita os poderes do Ministério que superintende a área das OSFL para adoptar regulamentos (e não leis) que assegurem que as referidas organizações não sejam manipuladas ou utilizadas para fins de branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e financiamento da proliferação de armas de destruição em massa. Obriga as organizações a conservarem as informações relativas ao objecto e à finalidade das suas actividades e identidade das pessoas que detêm, controlam ou dirigem as suas actividades, nomeadamente altos funcionários, membros do conselho de administração e gestores;

  • Obriga as organizações a publicar demonstrações financeiras anuais que incluam uma desagregação pormenorizada das suas receitas e despesas;

  • Recomenda as organizações a terem mecanismos internos de controlo adequados para garantir que todos os fundos são devidamente contabilizados e utilizados em conformidade com o objecto e a finalidade das actividades declaradas da organização;

  • Obriga as organizações a conservarem, por um período de pelo menos oito anos, registos de operações nacionais e internacionais suficientemente pormenorizados para permitir/verificar se os fundos foram utilizados em conformidade com o objecto e a finalidade da organização e a disponibilizarem estes registos quando solicitadas;

  • Determina que doações, donativos ou outras contribuições financeiras de qualquer título sejam feitas através de transferência bancária, para conta aberta em nome da organização ou através de cheque. 

Recomendações do GAFI na luta contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que: 

Das 40 recomendações emanadas pelo Grupo da Acção Financeira Internacional (GAFI) para os países adoptarem na luta contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, apenas uma (a recomendação 8) é específica para as organizações sem fins lucrativos.

A necessidade de conformação de Moçambique com a recomendação 8 do GAFI, como fundamento para a proposta de uma lei das organizações sem fins lucrativos é um equívoco.

Afinal, o que pede O GAFI na sua recomendação 8 (relativa às organizações sem fins lucrativos) e que Moçambique ainda não fez?

  • os países devem conduzir uma avaliação de risco ao sector e identificar qual o subconjunto de organizações que tem maior risco;

  • Os países devem divulgar e trabalhar com organizações sociais para que estas entendam possíveis riscos e desenvolvam as melhores práticas para mitigação de riscos;

  • Os países devem realizar uma supervisão baseada e proporcional ao risco.

De forma complementar, o GAFI também inclui uma extensa nota interpretativa para a Recomendação 8:

  • Faz referência ao imperativo de respeitar o direito internacional dos direitos humanos;

  • Indica que as medidas não devem interromper ou desencorajar actividades beneficentes legítimas;

  • Observa que as acções tomadas contra organizações sem fins lucrativos suspeitas de envolvimento em financiamento ao terrorismo devem minimizar o impacto negativo sobre os beneficiários inocentes e legítimos dos serviços de organizações sem fins lucrativos.

Moçambique na lista cinzenta do GAFI

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que: 

Moçambique entrou, em Outubro de 2022, na lista cinzenta do Grupo da Acção Financeira Internacional (GAFI) que coordena mundialmente a luta contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.

Isso significa que Moçambique está sujeito a um maior monitoramento e se comprometeu a resolver rapidamente as deficiências estratégicas identificadas dentro dos prazos acordados. Um dos principais pontos no plano de acção de Moçambique e, aliás, a única recomendação relativa às organizações sem fins lucrativos é a necessidade do Governo realizar uma avaliação de risco de financiamento ao terrorismo ao sector, de acordo com os padrões do GAFI e usá-la como base para desenvolver um plano de divulgação.

Liberdade de Criação e Processo de Constituição-complexo, oneroso e discricionário

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

Na proposta de lei das organizações sem fins lucrativos, à excepção do registo criminal (que foi retirado como uma exigência), o processo de constituição de organizações continua complexo, oneroso e sujeito à discrição das instituições de reconhecimento (MJACR e representações nos níveis provincial e distrital).

As associações e organizações da sociedade civil (OSC), mesmo reconhecendo que a lei 8/91 tinha estabelecido um marco histórico no que diz respeito ao direito à liberdade de associação em Moçambique vêm, desde 2008, pedindo a sua revisão para que, entre outros, inclua a simplificação do registo e reconhecimento, de modo a acompanhar o crescimento no número e na diversidade das organizações da sociedade civil.

As OSC propõem que:

  • O registo de OSC seja através da Conservatória de Registo de Entidades Legais e que a intervenção do Ministério da Justiça se restrinja à aferição da viabilidade dos fins da associação requerente de reconhecimento para atribuição de personalidade jurídica;

  • Sejam definidos prazos máximos para resposta a processos de constituição. E que, caso não haja resposta, o reconhecimento da associação seja automático;

  • Seja criado um balcão único, que funcionaria como único interlocutor dos interessados, cabendo à estrutura do Ministério da Justiça dinamizar os restantes passos (registo e publicações);

  • Seja apenas requerida a publicação da certidão de registo de entidades legais ou de um trecho dos estatutos no Boletim da República;

  • Seja reduzido o número exigido de membros fundadores.

Liberdade de Actuação e Autonomia-Administrativa das Associações

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante que saibas que:

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos restringe a liberdade e autonomia de actuação das organizações sociais ao impor regras mais intrusivas que a própria Lei contra o Branqueamento de Capitais e financiamento ao Terrorismo, ao introduzir exigências de informação onerosas e injustificadas e ao indicar que o Governo aprova, monitora e avalia as organizações. A proposta introduz poderes governamentais totalitários para criar, controlar, suspender e extinguir as organizações socias (vejam-se os artigos 33, 36, 37, 38, 56, 57, 68 da proposta de lei) e, assim, cria espaço a possíveis aproveitamentos por oficiais do Governo que não simpatizem ou não concordem com a linha de actuação de certas organizações.

Redução dos poderes da Assembleia Geral das organizações sociais

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que: 

Uma das intrusões da proposta de lei das organizações sem fins lucrativos na actuação e autonomia das organizações sociais (artigos 19 a 32) é de reduzir os poderes da Assembleia Geral das organizações sociais e de decidir sobre o seu funcionamento, ao impor um estatuto único e universal – decidindo ao detalhe sobre o funcionamento e a forma dos estatutos, o limite de mandatos, a forma de funcionamento e prestação de contas, os direitos dos membros e até referir no nº2 do artigo 21 que “Os membros dos órgãos sociais não podem abster-se de votar nas deliberações tomadas em reuniões que estejam presentes, e que estes são responsáveis pelos prejuízos delas decorrentes, salvo se houverem manifestado a sua discordância”, introduzindo assim elementos de fácil criminalização de titulares de órgãos sociais – se estiver doente a lei obriga voto por procuração; e também o efeito da saída de um associado.

"Prove que não praticou nenhum crime"

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

Uma das intrusões da proposta de lei das organizações sem fins lucrativos na actuação e autonomia das organizações sociais é a inversão do ónus da prova, com a exigência da prova da prossecução do seu objecto, do seu regular e bom funcionamento (artigo 33), tendo as organizações que submeter ao Governo, no primeiro trimestre de cada ano, o seu relatório de actividades, incluindo a contabilização dos fundos e das actividades realizadas. Sabes que a não apresentação do relatório referido no número anterior por duas vezes consecutiva implica a extinção da organização não-governamental nacional, nos termos do previsto na alínea g) número 2 do artigo 36” (art.º 33/3 da Proposta de Lei)? Esta regra é mais intrusiva do que para a generalidade das entidades abrangidas no regime prudencial do branqueamento de capitais e, na prática, as organizações sociais estão a ser tratadas como instituições públicas e têm que estar constantemente a provar que não praticaram nenhum crime.

Controlo das verbas das organizações sociais

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

Uma das intrusões da proposta de lei das organizações sem fins lucrativos na actuação e autonomia das organizações sociais (nº 3 artigo 41) é de controlar a alocação das verbas das organizações sociais. O nº 3 do artigo 41 – indica que as organizações beneficiárias de doações não podem dar descaminho às verbas recebidas, nem afectá-las a outras actividades, sob pena de responderem civil e criminalmente, juntamente com os órgãos sociais, nos termos da lei civil e da lei penal. Isto significa, na prática, que as organizações, ao invés de se sujeitarem aos seus órgãos sociais para (re)alocação das verbas, de acordo com as prioridades do contexto, sujeitam-se, agora, ao Governo como se os seus recursos proviessem do erário público.

Falta de entendimento sobre o substrato para constituição das associações

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que:

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos mostra falta de entendimento sobre o substrato para constituição das associações e das diversas práticas de financiamento destas ao exigir, no artigo 69, que as organizações sociais devem, no início da sua actividade provar a origem do financiamento e que o não cumprimento desta norma constitui fundamento para a suspensão do exercício da actividade da associação ou organização social. Diferentemente das fundações, cujo substrato é património, ou seja, constituído por um conjunto de bens afectos à prossecução de seus interesses e, assim, é mais facilmente possível mostrar a sua proveniência no início da sua actividade, no caso das associações, o seu substrato são pessoas que se juntam, formal ou informalmente, para seguirem fins do seu interesse e podem ou não ter financiamento/e ou património no início das suas actividades e ao longo do se exercício podem ou não identificar novas fontes de financiamento.

Extinção oficiosa

Cara(o) Cidadã(o) ou Associação,

É importante saberes que: 

A proposta de lei das organizações sem fins lucrativos pretende dar poderes ao Governo e extinguir os conferidos pelo artigo 5 da lei das associações em vigor, retirando às autoridades judiciais a sua competência na extinção e contestação da recusa de registo– e também remover os prazos. Que todos os artigos sobre o papel do poder judicial nas associações e organizações nacionais foram removidos. O que diz, afinal, a lei da associações em vigor (8/91 de 18 de Julho)?

  • Artigo 5 – A recusa do reconhecimento só poderá ser feita por despacho devidamente fundamentado, do qual caberá recurso para o Tribunal Administrativo no prazo de 15 dias a contar da data da sua notificação;

  • Limita os poderes governamentais ao registo/ reconhecimento das associações, deixando os poderes de controlo e extinção a cargo dos membros e do poder judicial – artigo 10;

  • Exige que alterações estatuárias que impliquem modificação dos objectivos da associação seja conhecidos pela entidade que regista, a qual tem o prazo de 45 dias para verificar a conformidade legal – não é mandatória a publicação imediata em Boletim da República;

Se o Estado não pode proibir (nem impor) a criação de uma associação ou a adesão a ela, também não pode, depois, pôr-lhe fim, ou suspender-lhe as actividades por via administrativa, ou sem motivo bastante. A extinção sancionatória está reservada, em Estado de Direito, aos tribunais, e em matéria penal, no pressuposto de uma infração de natureza penal, não administrativa, nem contravencional.

Nada para nós sem Nós!